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bedside matsuko 7 - para desaprender a conviver com a espera

by bedside matsuko

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1.
- ESTRAGON Eu tive um sonho. - VLADIMIR Não me conte! - ESTRAGON Eu sonhei que --- - VLADIMIR NÃO ME CONTE! - ESTRAGON (num gesto que abarca o Universo) Este aqui lhe basta? (Silêncio.) Isso não é gentil de sua parte, Didi. Para quem vou contar meus pesadelos particulares se não posso contá-los a você? - VLADIMIR Que permaneçam particulares. Você sabe que não posso suportá-los. - ESTRAGON (frio) Às vezes me pergunto se não seria melhor se a gente se separasse. - VLADIMIR Você não iria longe. - ESTRAGON Isso seria muito ruim, realmente muito ruim. (Pausa.) Não seria, Didi, realmente muito ruim? (Pausa.) Quando se pensa na beleza do caminho. (Pausa.) E na bondade dos viajantes. (Pausa. Sendo meigo.) Não seria, Didi?
2.
3.
É a maré de azar Que molda seu olhar atento Para o que não satisfaz? E é desse jeito, ponderado, Corretamente enquadrado Que se desenvolve o cerne Da questão do desgosto De viver como um encosto Sem lugar para ir e/ou ficar Estando superado Abra espaço para o singular Ele é aquele que em seu íntimo Aprendeu a misturar e tratar Diferentemente tudo aquilo que viu Parecido com o nosso caso, aqui No Brasil E é desse jeito, desengonçado, Mais na vontade que jeito Que se desalinha o verme Da questão do duplo peso De ter carregado maus encontros Quanto a guerras e crises profundas Neste jeito de agir e de pensar
4.
Dou preferência para a língua falada Em detrimento da escrita E não adianta chorar pela falta de firmeza Que a fala oferece, se perdendo ao vento Como um açúcar derretendo numa xícara de café A fala não se fecha ao contrário da cravada Sempre atual, atualizando os escritos de outrora Mas que dificuldade imensa essa de encontrar Palavras que venham a expressar o que quero dizer Sobre elas mesmas, as palavras em si, em relação Deixando o equívoco viúvo do sentido...
5.
- VLADIMIR Tudo o que sei é que, sob estas condições, as horas são longas e nos compelem a nos distrairmos com práticas que – como devo dizer – que podem parecer razoáveis à primeira vista, até se tornarem um hábito. Você pode argumentar que isso impede que nossa razão sucumba. Sem dúvida. Mas não estará a razão vagando pela noite sem fim das profundezas abissais? É isso que eu às vezes me pergunto. Você está acompanhando meu raciocínio?
6.
Qui qui qui qui não é qui qui qui Que bom é bom demais pra ser aqui Onde um faz hum e outro hum hum Mas que bom, todos hum! Como um dia, não ria Sorria como nós! Porque vós tem nome doce, e um som de voz Qui qui qui qui não é qui qui qui Que bom é bom demais pra ser aqui Onde um faz humm, e outro humm humm Mas que bom, todos humm! Como um dia, não ria Sorria como nós! Porque vós tem nome doce, e um som de voz Mais humm! Mais humm, Bahia! mais humm! Mais humm, buchinha! Todos humm como um dia Mais humm! Mais humm, Bahia! mais humm! Mais humm, buchinha! Todos humm como um dia Um dia como esse de Cosmos e Damião Você pode até dançar com Damião Mas quem contrariar a lei do Cosmos Não vai pagar - já paga ao contrariar!
7.
Eu tenho mais recordações do que há em mil anos. Uma cômoda imensa atulhada de planos, Versos, cartas de amor, romances, escrituras, Com grossos cachos de cabelo entre as faturas, Guarda menos segredos que o meu coração. É uma pirâmide, um fantástico porão, E jazigo não há que mais mortos possua. — Eu sou um cemitério odiado pela lua, Onde, como remorsos, vermes atrevidos Andam sempre a irritar meus mortos mais queridos. Sou como um camarim onde há rosas fanadas, Em meio a um turbilhão de modas já passadas, Onde os tristes pastéis de um Boucher desbotado Ainda aspiram o odor de um frasco destampado. Nada iguala o arrastar-se dos trôpegos dias, Quando, sob o rigor das brancas invernias, O tédio, taciturno exílio da vontade, Assume as proporções da própria eternidade. — Doravante hás de ser, ó pobre e humano escombro! Um granito açoitado por ondas de assombro, A dormir nos confins de um Saara brumoso; Uma esfinge que o mundo ignora, descuidoso, Esquecida no mapa, e cujo áspero humor Canta apenas os raios do sol a se pôr.
8.
Comprei uma briga bem maior que eu Sei disso, não nego nem me escondo Só deixo estar... Vezes, talvez na reta final dos encontros Que me puxaram pra baixo numa crise total É suficiente estar contente consigo mesmo? Ou tecer em si mesmo a ternura de se sentir abraçado pelo laço social: te doando licenciatura para legislar cada vez com mais poder e individualidade contando com a fraqueza geral... Existe uma galera... um acorde de vozes que teimam em me fazer apaixonar pela possibilidade virtual mas potente e então real de me tornar um outro ser; mais potente e independente das necessidades e leis que este mundo nos inquiriu e podem ser conferidas por qualquer olhar vil. Viu?
9.
- POZZO Ele parou de chorar. (A Estragon.) Você tomou o lugar dele. (Liricamente.) As lágrimas do mundo têm uma constância inabalável. Para cada um que pára de chorar, em algum outro lugar outro começa. O mesmo vale para o riso. (Ri.) Portanto não falemos mal de nossa geração. Ela não é mais infeliz que as anteriores. (Pausa.) Não falemos bem, tampouco. (Pausa.) Não falemos nada sobre isso. (Pausa. Prudentemente.) É verdade que a população tem aumentado.
10.
É a maré de azar Que molda seu olhar atento Para o que não satisfaz? E é desse jeito, ponderado, Corretamente enquadrado Que se desenvolve o cerne Da questão do desgosto De viver como um encosto Sem lugar para ir e/ou ficar Estando superado Abra espaço para o singular Ele é aquele que em seu íntimo Aprendeu a misturar e tratar Diferentemente tudo aquilo que viu Parecido com o nosso caso, aqui No Brasil E é desse jeito, desengonçado, Mais na vontade que jeito Que se desalinha o verme Da questão do duplo peso De ter carregado maus encontros Quanto a guerras e crises profundas Neste jeito de agir e de pensar
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Antes preciso averiguar se realmente há passo verdadeiro No compasso vislumbrante da vontade sazonal Já sabidamente domada pelo campo social ordeiro Para não estar em real recuando de maneira formal E sem saber, como um tolo e inocente animal Como tantos, nesse instante, soltos ao natural Sendo traçados pelo mais atento, pelo mais interessado Como os ferozes agentes do mercado e do estado Prontos a cumprir o regrado, concordado Acertado a assinaturas responsáveis e fundamentadas Mas deixo disso vez ou outra, dormindo ou acordado Para tentar acertar meus passos em uma vida que me forçou beligerante Mas não sem antes ter sido um viciado em refrigerante E, quem sabe, hoje em dia, menos ignorante
12.
Aprendi a incrementar o som da vida Com palavras que me encantam os tímpanos Guiam meu caminho pelo arbusto de ver Que não importa, eu não prevejo o que virá Eu só ensejo quando quero e quando dá Só ensejo dizer que o som se comunica sem falar Nosso desejo o abraça, mas normalmente se cala Porque a cidade nos conduz só a trampar Mata o lúdico; Sugere o gênero; Sepulta o público; Casteia em código; Decide o patético; Vira a página; Desempata a ética; Endeusa o gráfico; Atenua a penúria; Desmente a injúria; Define o ângulo; Rechaça a dúvida;
13.
- VLADIMIR Não vamos perder tempo com discussões inúteis! (Pausa. Veemente.) Vamos fazer alguma coisa, enquanto temos a oportunidade! Não é todo dia que precisam de nós. Não que precisem realmente de nós. Outros poderiam tratar do assunto tão bem quanto a gente, talvez até melhor do que a gente. Esses gritos de socorro que ainda ressoam em nossos ouvidos foram dirigidos à humanidade inteira! Mas neste momento, neste lugar, a humanidade inteira se resume em nós, queiramos ou não. Vamos fazer o melhor que pudermos, antes que seja tarde demais! Vamos representar dignamente, ao menos uma vez, o terrível papel que um cruel destino nos reservou! Que é que você me diz? (Estragon não diz nada.) É evidente, também, que, se ficarmos de braços cruzados, pesando os prós e os contras, também faremos justiça à nossa espécie. O tigre se precipita em socorro de seus congêneres sem a menor reflexão. Ou foge a se esconder nos emaranhados da selva. Mas a questão não é essa. O que é que estamos fazendo aqui? Esta é a questão. E somos abençoados por conhecer a resposta. Sim, em meio a essa imensa confusão, uma só coisa está clara: estamos esperando Godot.
14.
Qual é a causa do nosso sofrimento? Se buscamos sempre tentar estar Em um tempo e espaço diferente desse que aqui está Seja pra acusar um outro, seja para adentrar uma obra Seja pra dizer que não consegue superar um antigo mal Triste cair nisso, sempre evito Acredite mais na força do pensamento Entre outras, acredito mais na força do pensamento.

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released February 2, 2017

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