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Texto de: Clarice Lispector
Recitado por: Abujamra
Olhe para todos a seu redor, e veja o que temos feito de nós.
Não temos amado, acima de todas as coisas.
Não temos aceito o que não entendemos porque não queremos passar por tolos.
Nós temos amontoado coisas, coisas, coisas... mas não temos um ao outro.
Nós não temos nenhuma alegria que já não esteja catalogada.
Nós temos construído catedrais, e ficado do lado de fora pois as catedrais que nós mesmos construímos, nós tememos que sejam armadilhas.
Não nos temos entregue a nós mesmos, pois isso seria o começo de uma vida larga e nós a tememos.
Nós temos evitado cair de joelhos diante do primeiro de nós que por amor diga: tens medo.
Nós temos organizado associações e clubes sorridentes onde se serve com ou sem soda.
Nós temos procurado nos salvar mas sem usar a palavra salvação para não nos envergonharmos de ser inocentes.
Não temos usado a palavra amor para não termos de reconhecer sua contextura de ódio, de ciúme e de tantos outros contraditórios.
Nós temos mantido em segredo a nossa morte para tornar a nossa vida possível. Muitos de nós fazem arte por não saber como é a outra coisa!
Nós temos disfarçado com falso amor a nossa indiferença, sabendo que nossa indiferença é angústia disfarçada.
Nós temos disfarçado com o pequeno medo o grande medo maior e por isso nunca falamos o que realmente importa.
Falar no que realmente importa é considerado uma gaffe.
Não temos sido puros e ingênuos para não rirmos de nós mesmos e para que no fim do dia possamos dizer: "pelo menos não fui tolo!" e assim não ficarmos perplexos antes de apagar a luz.
Nós temos sorrido em público do que não sorriríamos quando ficássemos sozinhos. Temos chamado de fraqueza a nossa candura.
Temo-nos temido um ao outro, acima de tudo.
E a tudo isso consideramos a vitória nossa de cada dia!
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2. |
Flecha do tempo
01:34
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A gente se lança na ponta da lança
Calcula o destino, finge temperança
Recalcula a rota, idolatra a esperança
No tempo (ou espaço?)
E na flecha do tempo sempre sigo atento
Se firo, desculpa, foi só o momento
Calmo, em que escoa meu alento
Pensamento para tentar
Captar tudo o que passa
Sem dar pra notar
Em ouvidos a lapidar
E que de hoje em diante
Nós acreditemos no lugar que estamos
E estamos querendo
Pois a vida pesa e a matéria inverga
Pelo sulco passa e atinge minerva
Ah, mas foda-se isso, só quero um emprego
Um milagre divino, um condeno ao degredo
Fim do desespero, fim dos medos
Fim
Não
O fim nunca vem
E o que mais me aborrece é a necessidade
De taxá-lo sempre como algo que há de vir
A termodinâmica veio nos dar
A noção de um tempo
Que não volta
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3. |
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Seu moço, quer saber, eu vou cantar num baião
Minha história pra o senhor, seu moço, preste atenção
Eu vendia pirulito, arroz doce, mungunzá
Enquanto eu ia vender doce, meus colegas iam estudar
A minha mãe, tão pobrezinha, não podia me educar
A minha mãe, tão pobrezinha, não podia me educar
E quando era de noitinha, a meninada ia brincar
Vixe, como eu tinha inveja, de ver o Zezinho contar:
- O professor raiou comigo, porque eu não quis estudar
- O professor raiou comigo, porque eu não quis estudar
Hoje todo são "doutô", eu continuo joão ninguém
Mas quem nasce pra pataca, nunca pode ser vintém
Ver meus amigos "doutô", basta pra me sentir bem
Ver meus amigos "doutô", basta pra me sentir bem
Mas todos eles quando ouvem, um baiãozinho que eu fiz,
Ficam tudo satisfeito, batem palmas e pedem bis
E dizem: - João foi meu colega, como eu me sinto feliz
E dizem: - João foi meu colega, como eu me sinto feliz
Mas o negócio não é bem eu, é Mané, Pedro e Romão,
Que também foram meus colegas , e continuam no sertão
Não puderam estudar, e nem sabem fazer baião
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